Brasil ainda pedala devagar

Rafaela Aparecida de Almeida é doutora em Gestão Urbana e docente no Centro Universitário Internacional Uninter.

Enquanto cidades como Copenhague e Paris já transformaram a bicicleta em símbolo de mobilidade e qualidade de vida, o Brasil ainda pedala devagar rumo ao futuro sustentável. De acordo com pesquisa divulgada pela Confederação Nacional do Transporte em 2024, apenas 6,5% dos deslocamentos no Brasil são realizados com bicicletas próprias. O transporte público por ônibus lidera com 30,9%, seguido pelos carros particulares (29,6%) e pelos deslocamentos a pé (21,6%).

Esse cenário contrasta com a realidade de cidades como Paris (França), onde 11,2% das viagens no centro são feitas de bicicleta e apenas 4,3% por automóveis individuais, ou Copenhague (Dinamarca), onde 49% da população utiliza a bicicleta como principal meio de transporte diário.

Embora seja um meio de locomoção acessível, econômico e ambientalmente responsável, a bicicleta ainda ocupa um papel secundário nas cidades brasileiras. Seu uso cotidiano ainda é restrito a atividades esportistas de lazer ou voltadas para cicloativistas, quando poderia ser amplamente utilizada para deslocamentos diários ao trabalho e escola, por exemplo.

O que falta para que pedalar se torne uma escolha viável e segura para a maioria da população?

A resposta está nas condições estruturais e culturais das cidades. A cultura do automóvel, consolidada ao longo do século XX, ainda dita o ritmo do planejamento urbano, privilegiando vias rápidas, estacionamentos e o consumo de combustíveis fósseis. Paralelamente, as ciclovias e ciclofaixas, quando existem, são muitas vezes descontínuas, mal sinalizadas e desconectadas do transporte público. Mesmo com avanços em cidades como Curitiba e São Paulo, as iniciativas seguem pontuais e desconectadas.

Além da dimensão estrutural, há um obstáculo cultural igualmente significativo. O status social associado ao automóvel continua profundamente enraizado, simbolizando sucesso e poder. Romper com essa lógica exige educação, políticas públicas consistentes e uma mudança cultural.

Benefícios do uso da bicicleta

A ciclomobilidade está diretamente relacionada à qualidade de vida da população. Pedalar reduz o sedentarismo, melhora a capacidade cardiorrespiratória, diminui o estresse e fortalece o bem-estar mental. Ambientes urbanos que incentivam o deslocamento ativo apresentam menores índices de doenças crônicas, como obesidade e hipertensão, além de contribuírem para a redução dos custos com saúde pública e das perdas econômicas decorrentes de afastamentos por doenças.

Para o meio ambiente, uso da bicicleta representa a diminuição das emissões de gases de efeito estufa (GEE), além da redução a poluição sonora e do consumo de combustíveis fósseis. O panorama das emissões de GEE no Brasil em 2023 aponta que o setor de energia emitiu 420 MtCO₂e, o que representa 18% das emissões brasileiras. Deste percentual, 53,3% são provenientes do consumo de combustíveis em atividades de transporte.

Entretanto, para que essa transformação se torne realidade, é necessário garantir infraestrutura adequada e segura. Isso inclui redução da velocidade nas vias, criação de pistas segregadas, superfícies adequadas e sombreadas, ciclovias conectadas de ponta a ponta, sinalização eficiente, além da integração entre o transporte cicloviário e os modais coletivos, como trens e metrôs. Também é fundamental a oferta de bicicletários em áreas de grande circulação, assegurando conforto e praticidade aos ciclistas.

O planejamento urbano precisa, enfim, reverter a lógica de exclusividade do automóvel e colocar o pedestre e o ciclista no centro das políticas públicas de mobilidade.

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