O Estudo Econômico da América Latina e do Caribe 2023, que acaba de ser lançado, aponta um duplo desafio para os países da região. O primeiro é o baixo crescimento neste e no próximo ano. O segundo é, em meio a essa conjuntura de retração, viabilizar os investimentos necessários para ampliar sua resiliência às mudanças climáticas, reduzir seus riscos e buscar o desenvolvimento por meio de práticas sustentáveis.
O novo relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) prevê um cenário ainda de inflação e a persistência de juros altos na média do Continente, encarecendo o serviço das dívidas públicas e aumentando a pressão fiscal, agravada pela queda da arrecadação resultante do baixo desempenho do nível de atividade. Daí a premência de medidas capazes de estimular investimentos, criação de empregos e uma retomada mais robusta de expansão do PIB.
No Brasil, em particular, entendo que as prioridades para cumprirmos essas metas sejam as seguintes: regulamentação da reforma tributária; realização da administrativa, que precisa ser tocada com mais agilidade; eficácia do novo Arcabouço fiscal; melhoria da segurança jurídica e pública; desburocratização; fomento da pesquisa e inovação; e qualidade no ensino, em todos os níveis, de modo a capacitar os recursos humanos, melhorar a produtividade e proporcionar ganhos de competitividade.
Nossa capacidade de promover forte retomada do crescimento econômico, além da criação de empregos, inclusão e mais bem-estar social, será determinante para enfrentarmos o desafio do aquecimento terrestre, comum a todas as nações latino-americanas e caribenhas, apontado pelo novo estudo da Cepal. Cabe enfatizar que a região apresenta elevada vulnerabilidade às alterações climáticas, como testemunhamos com tristeza em nosso território, nas enchentes no Litoral Norte paulista, no último Carnaval, e nos recentes tufões no Rio Grande do Sul.
Brasil tem atividades suscetíveis a cataclismos
A maioria dos países do Continente localiza-se em áreas geográficas bastante expostas à intermitência de secas, vendavais e chuvas intensas, eventos cada vez mais severos. Além disso, a região, como no Brasil, tem significativa dependência de atividades econômicas muito suscetíveis aos cataclismos, como a agropecuária, mineração e turismo.
A Cepal estima que a compensação das perdas econômicas decorrentes das mudanças climáticas e adoção de medidas para atenuá-las e reduzir as emissões de gases de efeito estufa exigiriam investimentos entre 5% e 11% do PIB, dependendo do país. Ou seja, algo inviável para economias que, como demonstra o próprio estudo do organismo, seguem enfrentando baixo crescimento. Bancar tal volume de recursos provocaria, sem exageros, um caos fiscal. Assim, em paralelo à boa gestão orçamentária dos governos, buscando equacionar parte dos investimentos, é imprescindível maior cooperação internacional no sentido de viabilizar recursos destinados ao enfrentamento do problema.
Países emprestam em vez de doar recursos
O Brasil teve importante participação na Conferência de Copenhague-Dinamarca, em 2009, a COP15. Estive presente em missão da FIESP e, depois de muitos debates, ficou estabelecida a ajuda de US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 dos países desenvolvidos às nações pobres para a redução das emissões de carbono e o enfrentamento dos efeitos do aquecimento global. Entretanto, conforme demonstrou com clareza um relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgado no terceiro trimestre de 2022, os signatários não vêm cumprindo a promessa feita, os valores liberados são empréstimos e não doações.
O documento da OCDE merece crédito, inclusive por sua isenção, considerando que muitos dos signatários da organização são países inadimplentes no âmbito do Acordo de Paris e outros tratados correlatos. Num mundo que segue gastando trilhões de dólares em guerras e armas, é inadmissível a negligência com a agenda do clima. Não basta cobrar medidas das nações em desenvolvimento nos empolados discursos na ONU. É necessária ação concreta, pois o aquecimento da Terra e suas graves consequências não respeitam fronteiras e abalam todo o planeta.
*João Guilherme Sabino Ometto é engenheiro (Escola de Engenharia de São Carlos – EESC/USP), empresário e membro da Academia Nacional de Agricultura (ANA).